segunda-feira, 1 de agosto de 2011

5º Excerto do Livro "Contos de Sintra - Volume I"

    - E depois, e depois? - incitou ele no seu entusiasmo, fazendo esse com que espasmos na sua face se soltassem, que ruborizada e inchada parecia comunicar comigo debaixo da líquida superfície de um barril de vinho.
    - Bom, depois decidi-me a segui-lo, escondendo-me na medida do que me era possível, acossando-me atrás de vegetação rasteira. O guarda à medida que mais ia andando, mais se ia tornando suspeito pois começava mais nervosamente a olhar para os lados de quando em vez.
    - Mas para onde se dirigia ele? - perguntou, num cansado desconsolo, deixando mortiçamente cair os ombros após os ter levantado em decidida exaltação que totalmente se esbateu quando a pergunta saiu de sua boca.
    - Para a adega! Para a adega, Frei Cândido! - disse eu quase como se num sussurro bramasse, incorporando o Deus da justiça que o culpado acusava - E na adega se manteve durante instantes, até que saiu, carregando debaixo do seu braço uma das botijas…que certamente tinha um dos nossos melhores vinhos!
    - Ah! O canalha!
    - Mas como o meu bom Frei Cândido a ele se referiu, o canalha foi apanhado de surpresa. “Ó Sabugo!”, alguém gritou; “já vou, já vou”, disse ele atrapalhado e olhando para todos os lados, procurando uma fuga... Avistou a mina de água no caminho que segue por detrás do ajuntamento de carvalhos depois da horta, correu para lá amarrecado como um fuinha, abriu a porta, permaneceu um momento lá dentro, e de lá saiu, já sem a botija.
    - Oh! Mas que história, mas que história!
    - É como lhe conto, Frei Cândido, tal qual!
    - Ah, meu bom rapaz! Vamos já lá, e dividimos a botija! O aprovisionador assim por nada dará! Que dizes?
    - Se o Frei Cândido assim quiser…
    - E que mais queira, depois se verá…
    - Então vamos, Frei Cândido, mas com cuidado e sem luz, não vá acordarmos alguém…
    - Certo, certo. - disse-o, e quando se levantava do cepo enquanto suas pernas afastava, o seu hábito arrastou o gargalo de uma botija que debaixo dele havia habilmente escondido, a qual acabou por embater no chão com estrondo rompendo aquele silêncio que impávido e sonolento se mantinha por todo o convento. Na sua bebedeira o estrondo ignorou da mesma maneira e com a feliz sorte de todos no convento igualmente terem ignorado o ruído nos seus pesados sonos - e certamente, leves sonhos de desconforto e penitência.


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